sexta-feira, 26 de junho de 2009

14.º Domingo Comum

14.º Domingo do Tempo Comum – Ano B – 2009

Ez 2,2-5 – Salmo 122 – 2.ª Coríntios 12,7-10 – Marcos 6,1-6

O tema das leituras de hoje é a recepção que se dá ao profeta, isto é, àquele pelo qual é Deus mesmo que fala. O profeta não é necessariamente alguém que prediz o futuro, como muita gente pensa, mas aquele que traz a Palavra do próprio Deus. Muitas vezes o profeta é rejeitado, porque a Palavra de Deus vai contra os planos humanos e aquele que traz essa Palavra tão incômoda carrega sobre si a rejeição que as pessoas devotam à própria Palavra de Deus.
Na Leitura da Profecia de Ezequiel repete-se por três vezes se chama ao povo de Israel de bando de rebeldes. É Deus que denuncia que o povo rejeita a sua Palavra. A rebeldia leva as pessoas ao pecado, a se afastarem de Deus. A atitude contrária é a ação de graças diante da Palavra criadora de Deus, que tudo criou e é verdadeira e nos conduz para o bem. Em toda celebração eucarística é lembrada a ação de graças como atitude de salvação. O sacerdote diz: “Na verdade, é justo e necessário, é nosso dever e salvação dar-vos graças sempre e em todo lugar, Senhor Pai santo, Deus eterno e todo poderoso”. Os pensamentos das pessoas distam dos pensamentos de Deus como o Céu dista da terra (Is 55,9). Mas o profeta deve falar independentemente de ser escutado ou não, pois a Palavra de Deus deve sempre advertir as pessoas sobre o caminho da verdade. Por isso se diz: “Quer te escutem, quer não – pois são um bando de rebeldes – ficarão sabendo que houve entre eles um profeta” (Ez 2,5). Muitos profetas foram perseguidos a princípio e só depois respeitados e ouvidos, confirmando essa palavra “ficarão sabendo que houve entre eles um profeta”. É o caso de Jeremias, por exemplo. No Evangelho, Jesus, fiel à tradição profética de Israel, é rejeitado pelos de sua terra, de Nazaré, que se recusavam a ver n’Ele alguém diverso do carpinteiro que tinham conhecido durante a vida oculta de Jesus. Identificam Jesus como o filho de Maria e irmão de Tiago, de José, de Judas e de Simão. Segundo Mt 27,56, Mc 15,40 e Lc 24,10, Tiago e José eram filhos de outra Maria, que não é Maria Santíssima. Segundo At 1,13, Judas era irmão de Tiago, ou seja, filho da mesma Maria. De modo que esses “irmãos de Jesus” não eram filhos de Maria Santíssima, a mãe de Jesus, mas parentes próximos. Maria é sempre Virgem, antes durante e depois de ter Jesus Cristo, a esposa de Deus, figura da Igreja.
Na Leitura da Segunda Carta de São Paulo aos Coríntios revela-se que Deus se serve de homens fracos para seus profetas. Não é do feitio de Deus o triunfalismo ou servir-se de pessoas admiradas pela sociedade, pelos seus dotes, riqueza, inteligência ou força física. Isto para que se revele uma força não humana no seu profeta, uma força que vem de Deus. Assim o profeta conclui: “pois quando eu me sinto fraco, é então que sou forte” (2Cor 12,10). O profeta é forte de uma força que lhe é dada do Alto, sobre a qual ele não tem poder. É Deus que o sustenta. É Deus que fala por meio dele e o profeta é um instrumento de Deus, chamado por Ele para as obras da misericórdia que Deus quer ter em relação ao seu povo.
Todo aquele que ensina ao povo a Palavra de Deus pode ser comparado aos profetas. Deus não escolhe os fortes, mas os simples, que são capazes de obedecer-Lhe e ser instrumentos dóceis em suas mãos. Os que se apóiam em recursos humanos tendem ao orgulho e auto-suficiência e não são dóceis ao Senhor. Os humildes é que servem melhor aos planos de Deus, como Maria Santíssima, da qual o Senhor viu a humildade (f. Lc 1,48). Por isso os que servem ao Senhor no ministério da Palavra como os catequistas e outros podem ter fraquezas como São Paulo, mas não devem ter timidez e devem falar a Palavra do Senhor sem respeito humano, pois sua força é Deus mesmo que fala pela sua boca. “Se alguém se envergonhar de mim e das minhas palavras, também o Filho do Homem se envergonhará dele, quando vier na sua glória, na glória de seu Pai e dos santos anjos” (Lc 9,26).

terça-feira, 23 de junho de 2009

Transfiguração - Samba

A Transfiguração
Samba do Padre Afonso Chrispim

Precisamos aprender
Que mesmo do mal e da dor,
O bem pode aparecer
Se ao mal respondermos com amor!

Tanta beleza há no mundo
E também tanta bondade.
Sabemos que tudo, no fundo,
Traz nossa felicidade!
Por isso, passamos a crer
Que tudo o que acontecer
Serve p’ra gente crescer! (bis)

Precisamos aprender
Que mesmo do mal e da dor,
O bem pode aparecer
Se ao mal respondermos com amor!

Houve um menino, do qual
Os pais, ninguém quis receber
E só encontraram um curral
Para o menino nascer!
Nem vimos cena daquela
Anjos, pastores e estrela
E humildade, que coisa mais bela! (bis)

Precisamos aprender
Que mesmo do mal e da dor,
O bem pode aparecer
Se ao mal respondermos com amor!

O filho cresceu bem criado.
Mostrou ser o Filho de Deus,
Mas logo foi odiado
Pelos que eram dos seus!
Na cruz, o prenderam e morreu,
E essa cruz na qual padeceu
Em prova de amor converteu! (bis)

Precisamos aprender
Que mesmo do mal e da dor,
O bem pode aparecer
Se ao mal respondermos com amor!

Para reverter mal em bem,
Façamos sempre oração:
Só Deus, que é Pai, é que tem
Poder de transformação!
Então pedimos, Senhor,
Saber p’ra tirar paz da dor,
Mudando o ódio em amor! (bis)

Precisamos aprender
Que mesmo do mal e da dor,
O bem pode aparecer
Se ao mal respondermos com amor!

São Pedro e São Paulo

São Pedro e São Paulo Apóstolos – Ano B – 2009

Atos dos Apóstolos 12,1-11 – Salmo 33 – 2.ª Timóteo 4,6-8.17-18 – Mateus 16,13-19

Na Leitura dos Atos dos Apóstolos temos o martírio do primeiro dos Apóstolos a ser martirizado, São Tiago Maior, o irmão de São João Evangelista, filho de Zebedeu. Isso agradou aos judeus, que, segundo os Atos dos Apóstolos, são os maiores inimigos da Igreja. Por isso foi preso também São Pedro e a Igreja intercedia continuamente por ele. A libertação de São Pedro é contada como uma repetição da libertação do povo de Israel do Egito. Os Atos dizem que eram os dias dos Ázimos, isto é, da Páscoa judaica. As duas correntes que prendem São Pedro simbolizam a escravidão no Egito. O anjo diz para São Pedro se levantar depressa, tal como na saída do Egito houve uma certa pressa (cf. Ex 12,51). O portão que se abre sozinho lembra a abertura do Mar Vermelho para os israelitas passarem. Isto significa que São Pedro, que tem a palavra que confirma a fé dos cristãos, novo povo de Deus, simboliza o novo povo de Deus todo, que não é mais Israel (cf. Mt 21,43). O salmo celebra essa libertação, ressaltando o aspecto interior dos temores internos de São Pedro, que reconhece que foi o Senhor quem o libertou (cf. At 12,11). Não devemos temer nenhuma criatura, mas temer só a Deus e esse temor é um dom do Espírito Santo e o princípio da Sabedoria (cf. Eclo 19,18).
A Segunda Carta a Timóteo traz o testamento de São Paulo. Este, consciente de ter cumprido muito bem a sua missão se apresenta com toda a confiança diante do martírio, ciente de que receberá o prêmio dos que obedeceram a Deus.
O Evangelho traz o testemunho da fé de São Pedro, inspirada não por raciocínios humanos, mas pela graça de Deus, de que Jesus é o Cristo, o Messias anunciado pelos profetas. Jesus então muda o nome de Simão para Pedra (Pedro é uma tradução menos perfeita: Kefas, em hebraico quer dizer Pedra, não Pedro). Ou seja, Jesus edifica sua Igreja sobre a pedra, a Palavra de Deus inspirada do Alto, para que ela permaneça e o poder do inferno nunca a destrua. “Nem todo aquele que me diz: Senhor, Senhor, entrará no Reino dos céus, mas sim aquele que faz a vontade de meu Pai que está nos céus. Muitos me dirão naquele dia: Senhor, Senhor, não pregamos nós em vosso nome, e não foi em vosso nome que expulsamos os demônios e fizemos muitos milagres? E, no entanto, eu lhes direi: Nunca vos conheci. Retirai-vos de mim, operários maus! Aquele, pois, que ouve estas minhas palavras e as põe em prática é semelhante a um homem prudente, que edificou sua casa sobre a rocha. Caiu a chuva, vieram as enchentes, sopraram os ventos e investiram contra aquela casa; ela, porém, não caiu, porque estava edificada na rocha. Mas aquele que ouve as minhas palavras e não as põe em prática é semelhante a um homem insensato, que construiu sua casa na areia. Caiu a chuva, vieram as enchentes, sopraram os ventos e investiram contra aquela casa; ela caiu e grande foi a sua ruína” (Mt 7,21-27). E também podemos ver que a intenção de Jesus é falar e definir a verdade através de São Pedro e seus sucessores por outras passagens: “Simão, Simão, eis que Satanás vos reclamou para vos peneirar como o trigo; mas eu roguei por ti, para que a tua confiança não desfaleça; e tu, por tua vez, confirma os teus irmãos na fé” (Lc 22,31-32). E também: “Tendo eles comido, Jesus perguntou a Simão Pedro: Simão, filho de João, amas-me mais do que estes? Respondeu ele: Sim, Senhor, tu sabes que te amo. Disse-lhe Jesus: Apascenta os meus cordeiros. Perguntou-lhe outra vez: Simão, filho de João, amas-me? Respondeu-lhe: Sim, Senhor, tu sabes que te amo. Disse-lhe Jesus: Apascenta os meus cordeiros. Perguntou-lhe pela terceira vez: Simão, filho de João, amas-me? Pedro entristeceu-se porque lhe perguntou pela terceira vez: Amas-me?, e respondeu-lhe: Senhor, sabes tudo, tu sabes que te amo. Disse-lhe Jesus: Apascenta as minhas ovelhas” (Jo 21,15-17). Somente a São Pedro Jesus Cristo falou estas coisas e a mais nenhum Apóstolo. Vemos também que a comunidade cristã primitiva prezava acima de todas as outras, as palavras de São Pedro ao constatar que nos Evangelhos quase sempre é São Pedro a falar por todos os Apóstolos. Por isso, hoje é também o Dia do Papa. A palavra do Papa é a certeza de que a nossa fé é a mesma que Jesus Cristo ensinou. Jesus fala à Igreja pelo Papa, que ligando e desligando na terra, está ligando e desligando também nos céus. As igrejas sem o Papa, como os protestantes, se perdem em interpretações relativas da Bíblia e aparecem mil denominações com doutrinas diferentes. Acaba uma grande Babel, confusão, ao invés da unidade desejada por Jesus Cristo (cf. Jo 17,22).

segunda-feira, 15 de junho de 2009

12.º Domingo Comum

12.º Domingo do Tempo Comum – Ano B – 2009

Jó 38,1.8-11 – Salmo 106 – 2.ª Coríntios 5,14-17 – Marcos 4,35-41

A oração antes das Leituras diz a Deus: “pois nunca cessais de conduzir os que firmais em vosso amor”. Tal como no domingo anterior, hoje também a pessoa humana é convidada a se render diante da onipotência de seu Criador e amá-lO, confiar n’Ele, adquirindo a Paz, deixando-se cuidar plenamente por Ele.
No Livro de Jó, somos convidados a contemplar o poder de Deus Criador que tudo dispôs com ordem e harmonia. O Salmo 106 continua essa contemplação, convidando a renunciar a todo pânico na confiança no Senhor, que acalma o mar e ressuscita os mortos.
No Evangelho, Jesus realiza o que o Salmo anuncia, demonstrando sua divindade. Diante da tempestade, a confiança de Jesus no Pai e total a ponto que permanece dormindo. Acordado pelos discípulos apavorados, que intuem que devem recorrer a Jesus, este acalma o mar e os ventos. É interessante que os discípulos recorrem a Jesus, mas este não elogia sua fé, uma vez que os discípulos recorreram com confiança a Ele. Jesus repreende sua falta de fé, pois não mantém a paz (de Cristo) nas dificuldades, mas se apavoram. Será que diante de muitas de nossas orações, O Senhor não reage da mesma maneira e nos diz: “Por que sois tão medrosos? Ainda não tendes fé?” (Mc 4,40). O que Jesus Cristo considera como sinal verdadeiro de fé não é a oração e os pedidos de socorro, por mais insistentes que sejam, mas a PAZ de quem confia plenamente no Senhor e Criador, que não abandona nunca suas criaturas, mas que as faz vencer até a própria morte.
O trecho da Segunda Carta aos Coríntios lido hoje, nos induz a uma consideração espiritual de todas as coisas. Se Jesus Cristo nos salva da morte, Ele adquire um direito sobre as nossas vidas – que Ele já tinha como Palavra Criadora do Pai, pela qual fomos criados (cf. Jo 1,1-3) – e por isso devemos viver não mais para nós mesmos, mas para Ele, que por nós morreu e ressuscitou. Diz São Paulo, nessa direção: “Também nós cremos em Jesus Cristo, e tiramos assim a nossa justificação da fé em Cristo, e não pela prática da lei. Pois, pela prática da lei, nenhum homem será justificado. Pois, se nós, que aspiramos à justificação em Cristo, retornamos, todavia, ao pecado, seria porventura Cristo ministro do pecado? Por certo que não! Se torno a edificar o que destruí, confesso-me transgressor. Na realidade, pela fé eu morri para a lei, a fim de viver para Deus. Estou pregado à cruz de Cristo. Eu vivo, mas já não sou eu; é Cristo que vive em mim. A minha vida presente, na carne, eu a vivo na fé no Filho de Deus, que me amou e se entregou por mim” (Gl 2,16b-20). A partir dessa certeza de que pertencemos a Jesus Cristo, não devemos mais considerar as realidades segundo os instintos da natureza mortal, mas todas as coisas e pessoas devem ser reconsideradas a partir do seu significado como graça de Deus e no que concorrem para a nossa salvação, a nossa vida segundo o Espírito Santo, que nos unifica a Jesus Cristo, pelo qual teremos a vida eterna. Assim tudo se faz novo, e nós mesmos nos tornamos uma nova criatura, antecipando a vida eterna que gozaremos eternamente. Por isso o amor de Jesus Cristo é que nos impele (cf. 2Cor 5,14) e deve ser a fonte de todas as nossas decisões e inclinações.
Isto tudo é um convite a reconsiderar todas as coisas a partir de Jesus Cristo, nosso Salvador. As coisas só tem sentido na medida em que são consideradas sinais do amor de Deus e nos aproximam do nosso Criador, que deve ser sempre o amor que amamos em todas as coisas.
Ao saborear qualquer realidade da vida devemos perceber o amor de Deus nessa coisa, seja uma alimento, uma paisagem, uma pessoa ou uma obra de arte. Também aquilo que nos faz sofrer deve ser remetido ao mistério e ser transfigurado de mal em bem. Jesus transfigurou todas as realidades negativas em positivas. Todas as realidades negativas, que nos fazem sofrer, são questionamentos ao amor de Deus. A dor, a decepção, o abandono, a morte, as traições e tudo o mais que nos faz sofrer são tentações contra o amor de Deus. Os sofrimentos de Jesus Cristo eram tentações satânicas que questionavam a condição de Jesus como Filho amado de Deus. Jesus esperou no Pai contra toda aparência e tentação e venceu o mal, transfigurando sua tortura em gesto de amor total. Nós também, na medida em que nossos sofrimentos questionam o amor de Deus por nós, se não nos deixamos levar pela tristeza, mas continuamos a confiar em Deus, nosso Pai, vencemos o demônio e a sua tentação e gozamos da PAZ de Jesus Cristo, transfigurando o sofrimento, que em si é negativo, em vitória contra o mal, em libertação. Podemos dizer que a vida cristã toda é uma arte de transfigurar o mal em bem pela vivência da paixão de Jesus Cristo em nós. São Paulo tinha plena consciência disto e o testemunha em vários textos. “Agora me alegro nos sofrimentos suportados por vós. O que falta às tribulações de Cristo, completo na minha carne, por seu corpo que é a Igreja” (Cl 1,24). “Na verdade, julgo como perda todas as coisas, em comparação com esse bem supremo: o conhecimento de Jesus Cristo, meu Senhor. Por ele tudo desprezei e tenho em conta de esterco, a fim de ganhar Cristo e estar com ele. Não com minha justiça, que vem da lei, mas com a justiça que se obtém pela fé em Cristo, a justiça que vem de Deus pela fé. Anseio pelo conhecimento de Cristo e do poder da sua Ressurreição, pela participação em seus sofrimentos, tornando-me semelhante a ele na morte, com a esperança de conseguir a ressurreição dentre os mortos. Não pretendo dizer que já alcancei (esta meta) e que cheguei à perfeição. Não. Mas eu me empenho em conquistá-la, uma vez que também eu fui conquistado por Jesus Cristo. Consciente de não tê-la ainda conquistado, só procuro isto: prescindindo do passado e atirando-me ao que resta para a frente, persigo o alvo, rumo ao prêmio celeste, ao qual Deus nos chama, em Jesus Cristo” (Fl 3,8-14).

quarta-feira, 10 de junho de 2009

11.º Domingo Comum

11.º Domingo do Tempo Comum – Ano B – 2009

 

Ezequiel 17,22-24 – Salmo 91 – 2.ª Coríntios 5,6-10 – Marcos 4,26-34

 

A oração da coleta, feita antes das leituras, de hoje já diz: “e como nada podemos em nossa fraqueza, dai-nos sempre o socorro da vossa graça”. Este é um dos temas centrais destas leituras deste domingo: a fraqueza dos cristãos, cuja força é Deus mesmo. Já São Paulo na Primeira Carta aos Coríntios dizia: “A linguagem da cruz é loucura para os que se perdem, mas, para os que foram salvos, para nós, é uma força divina. Está escrito: Destruirei a sabedoria dos sábios, e anularei a prudência dos prudentes (Is 29,14). Onde está o sábio? Onde o erudito? Onde o argumentador deste mundo? Acaso não declarou Deus por loucura a sabedoria deste mundo? Já que o mundo, com a sua sabedoria, não reconheceu a Deus na sabedoria divina, aprouve a Deus salvar os que crêem pela loucura de sua mensagem. Os judeus pedem milagres, os gregos reclamam a sabedoria; mas nós pregamos Cristo crucificado, escândalo para os judeus e loucura para os pagãos; mas, para os eleitos - quer judeus quer gregos -, força de Deus e sabedoria de Deus. Pois a loucura de Deus é mais sábia do que os homens, e a fraqueza de Deus é mais forte do que os homens. Vede, irmãos, o vosso grupo de eleitos: não há entre vós muitos sábios, humanamente falando, nem muitos poderosos, nem muitos nobres. O que é estulto no mundo, Deus o escolheu para confundir os sábios; e o que é fraco no mundo, Deus o escolheu para confundir os fortes; e o que é vil e desprezível no mundo, Deus o escolheu, como também aquelas coisas que nada são, para destruir as que são. Assim, nenhuma criatura se vangloriará diante de Deus. É por sua graça que estais em Jesus Cristo, que, da parte de Deus, se tornou para nós sabedoria, justiça, santificação e redenção, para que, como está escrito: quem se gloria, glorie-se no Senhor (Jr 9,23)” (1Cor 1,18-31).

Os dons de Deus dados a alguém nunca devem ser usurpados para o orgulho dos seus detentores. Porque tudo é graça de Deus e Ele é a fonte de todos os dons. Como a pessoa humana usurpa os dons de Deus e os utiliza para envaidecer-se, Deus, “que resiste aos soberbos, mas dá sua graça aos humildes” (Pr 3,34; Tg 4,6) escolhe os menos prendados para receber a graça maior, que é a da salvação. Deus, assim “eleva a árvore baixa e rebaixa a árvore alta e faz secar a árvore verde e faz brotar a árvore seca” (Ez 17,24). Sempre foi esse o procedimento de Deus, escolhendo sempre os mais fracos e fazendo-os os mais fortes. Foi assim com Abel, mais novo que Caim. Foi assim com Jacó, preferido a Esaú. Foi assim com José, vendido como escravo por seus irmãos, tornado depois vice-rei do Egito. Foi assim com Davi, preferido a Saul, que era alto e forte, e a seus irmãos de sangue, ele, que era o irmão mais novo da família de Jessé. Foi assim também na vida de muitos santos que eram os filhos menores em suas famílias, mas foram escolhidos por Deus, como São João Bosco e outros. A viúva que menos ofereceu em valor absoluto foi a que mais agradou a Deus (cf. Mc 12,41-44).

Na Segunda carta aos coríntios São Paulo afirma: “Por isso, também nos empenhamos em ser agradáveis a Ele” (2Cor 5,9). O que nos torna agradáveis a Deus? É a ação de graças, atribuindo a Deus toda grandeza humana e nunca se inchando de orgulho, como está no Salmo 91, rezado hoje na Missa. E a colocação dos dons que vem de Deus como benefício para os nossos irmãos. Como disse Jesus a seus apóstolos: “De graça recebestes, de graça dai” (Mt 10,8c).

O Evangelho sublinha que o crescimento do Reino de Deus é ação divina, com apenas uma pequena colaboração humana. A pessoa do cristão anuncia o Reino, mas é a graça de Deus que transforma os corações, pelo dom do Espírito Santo. Essas palavras de Jesus Cristo devem nos encher de confiança diante das milhares de dificuldades pelas quais passa a evangelização, as perseguições que a Igreja sofre, os impecilhos que encontra em sua missão, dentro e fora da Igreja. A obra é de Deus e o Espírito de Deus sopra onde quer. “O vento sopra onde quer; ouves-lhe o ruído, mas não sabes de onde vem, nem para onde vai. Assim acontece com aquele que nasceu do Espírito” (Jo 3,8), disse Jesus a Nicodemos.

Sejamos humildes e saibamos sempre atribuir a Deus as obras que Ele realiza em nós, nunca nos ensoberbecendo como se fôssemos nós mesmos a dar-nos os dons de que dispomos.

segunda-feira, 8 de junho de 2009

Corpus Christi

Corpus Christi

Ex 24,3-8 – Salmo 115 – Hb 9,11-15 – Mc 14,12-16.24-26

Na Leitura do Livro do Êxodo vemos um ritual onde o povo de Israel jura fidelidade duas vezes a Deus: “Faremos tudo o que o Senhor nos disse” (Ex 24,3.7). As doze tribos de Israel estão presentes, através dos doze marcos colocados por Moisés. Assim, a celebração da Eucaristia também é um ritual de fidelidade a Jesus Cristo e em cada comunidade cristã está presente toda a Igreja, como em cada pedaço da hóstia consagrada está presente Jesus Cristo inteiro e não aos pedaços. “Porque onde dois ou três estão reunidos em meu nome, aí estou eu no meio deles” (Mt 18,20). Onde está Jesus Cristo está a sua Igreja. Vê-se também como Moisés lê em voz alta o Livro da Aliança e o povo responde a palavra da fidelidade. A proclamação clara e alta da Palavra de Deus faz parte da celebração da Eucaristia e merece toda atenção. Os sacramentos, fora da Palavra de Deus perdem a sua substância. Muitos querem os sacramentos mas não querem prestar atenção e obediência à Palavra de Deus. Os sacramentos acabam servindo à mente supersticiosa da pessoa, como “bênção” ou sinal de sorte, e na verdade são para que Jesus Cristo viva e habite em cada cristão. O sangue dos cordeiros era aspergido sobre o povo. O sangue de Jesus Cristo é bebido pelo povo como sinal da comunhão de vida entre Jesus e o cristão.

No salmo celebra-se o caráter de ação de graças contido em cada Eucaristia, e renova-se a palavra de fidelidade dita pelos cristãos na Missa: “Vou cumprir minhas promessas ao Senhor na presença de seu povo reunido” (Sl 115,5.9).

Na Leitura da Carta aos Hebreus há a proclamação de uma profunda diferença entre o culto quase-pagão do Antigo Testamento e o culto cristão. Na Antiga Aliança, celebrava-se oferecendo a Deus animais e outras vítimas. Na Nova e Eterna Aliança o que é oferecido é o próprio cristão no seu corpo mortal, que, oferecido a Deus, Ele o ressuscitará: “Creio na ressurreição da carne”, rezamos no Credo. Também São Paulo esclarece este ponto: “Eu vos exorto, pois, irmãos, pelas misericórdias de Deus, a oferecerdes vossos corpos em sacrifício vivo, santo, agradável a Deus: é este o vosso culto espiritual” (Rm 12,1). O culto espiritual é o culto que não é um ritual em um templo, mas é o culto vivido na própria vida de todos os dias, na caridade e na cruz de cada dia. É o culto em espírito e verdade do qual falou Jesus ao afirmar que não era nem na Samaria nem em Jerusalém que os verdadeiros adoradores adorariam a Deus: “Senhor, disse-lhe a mulher, vejo que és profeta!... Nossos pais adoraram neste monte, mas vós dizeis que é em Jerusalém que se deve adorar. Jesus respondeu: Mulher, acredita-me, vem a hora em que não adorareis o Pai, nem neste monte nem em Jerusalém. Vós adorais o que não conheceis, nós adoramos o que conhecemos, porque a salvação vem dos judeus. Mas vem a hora, e já chegou, em que os verdadeiros adoradores hão de adorar o Pai em espírito e verdade, e são esses adoradores que o Pai deseja. Deus é espírito, e os seus adoradores devem adorá-lo em espírito e verdade. Respondeu a mulher: Sei que deve vir o Messias (que se chama Cristo); quando, pois, vier, ele nos fará conhecer todas as coisas. Disse-lhe Jesus: Sou eu, quem fala contigo” (Jo 4,19-26).

Ressalta-se também que Jesus Cristo veio como sumo-sacerdote de bens futuros (Hb 9,11), e os que são chamados a crerem n’Ele recebem a promessa da herança eterna (Hb 9,15c). Isto é muito importante pois a Eucaristia é uma comunhão terrena com Jesus no meio de provações e tentações, algumas das quais fazem o cristão perder a comunhão plena com o Senhor. A comunhão plena só será assegurada quando vierem os bens futuros na Vida eterna e bem- aventurada nos Céus, isto é, na plena comunhão da Santíssima Trindade. A vida eterna tem que fazer parte da vida espiritual de cada cristão e ser objeto da virtude teologal da esperança, muito além de qualquer esperança de bem ou justiça terrenas, sob pena do cristianismo perder sua substância.

O Evangelho narra que Jesus nos dará o Seu Corpo e o Seu Sangue na Paixão, para nos libertar do poder do pecado do mundo. Cada cristão que entra em comunhão com Jesus Cristo deve também aceitar sua cruz de cada dia e dar sua vida em intercessão pela salvação do mundo. “Em seguida, Jesus disse a seus discípulos: Se alguém quiser vir comigo, renuncie-se a si mesmo, tome sua cruz e siga-me. Porque aquele que quiser salvar a sua vida, perdê-la-á; mas aquele que tiver sacrificado a sua vida por minha causa, recobrá-la-á. Que servirá a um homem ganhar o mundo inteiro, se vem a prejudicar a sua vida? Ou que dará um homem em troca de sua vida?... Porque o Filho do Homem há de vir na glória de seu Pai com seus anjos, e então recompensará a cada um segundo suas obras” (Mt 16,24-27). O cristão é membro do Corpo de Cristo, a sua vida é a vida de Jesus Cristo nele. Diz São Paulo: “Na realidade, pela fé eu morri para a lei, a fim de viver para Deus. Estou pregado à cruz de Cristo. Eu vivo, mas já não sou eu; é Cristo que vive em mim. A minha vida presente, na carne, eu a vivo na fé no Filho de Deus, que me amou e se entregou por mim” (Gl 2,19-20).

terça-feira, 2 de junho de 2009

Santíssima Trindade

Domingo da Santíssima Trindade

Dt 4,32-34.39-40 – Salmo 32 – Rm 8,14-17 – Mt 28,16-20

Hoje, após o Tempo Pascal, a Igreja dedica um domingo ao Mistério central da Fé Cristã: Deus não é uma só Pessoa, mas são Três Pessoas, em perfeita comunhão de Vida, um só Deus. Deus é amor, é comunhão de Pessoas e nós somos chamados a participar dessa vida, pela comunhão com o Filho, na unidade entre Pessoas realizada pelo Espírito Santo. A oração feita antes das Leituras já nos esclarece que duas Pessoas foram enviadas a nós para essa finalidade: a Palavra da Verdade, que é o Filho, Jesus Cristo, e o Espírito Santo, pelo qual Jesus vive em nós e nos tornamos, pela comunhão de vida com Ele, filhos de Deus. Os antigos Padres da Igreja diziam que Deus se tinha tornado homem para que o homem se tornasse Deus, fosse divinizado pela comunhão de vida eterna com as Pessoas Divinas.

As leituras são direcionadas nesse sentido. A Leitura do Deuteronômio quer nos mostrar a intimidade com que o único Deus verdadeiro tratou a humanidade. E por esta intimidade, exortar a que seja obedecido nos seus mandamentos, Ele de Quem depende absolutamente toda criatura, especialmente a criatura humana. O Salmo festeja essa intimidade, felicitando não apenas um povo, que o Senhor Deus escolheu por sua herança, mas como se pode ler na Carta aos Romanos, toda a humanidade, chamada a essa comunhão com Deus em Jesus Cristo, no Espírito Santo.

Seja feita atenção ao trecho da Carta aos Romanos onde se lê: “vós não recebestes um espírito de escravos para recairdes no medo, mas um espírito de filhos ... no qual todos nós clamamos: ‘Abá, ó Pai!’”. De fato, pelo Evangelho, somos libertados dos medos que caracterizam o paganismo, do medo de sofrer, do medo das perdas da vida, do medo do azar, coisas que escravizam os pagãos aos falsos profetas, que lhes incutem medo de desgraças e castigos e os mantêm assim escravizados a si mesmos. Por isso, o trecho da carta lido hoje termina com a frase “se realmente sofremos com Ele, é para sermos também glorificados com Ele”. O cristão sabe que na terra, Deus não é amado pelos homens pecadores e ambiciosos de serem auto-suficientes e não mais dependerem do Deus Único – o que é uma mentira, pois são criaturas e por isso são sempre dependentes. Portanto, aqueles que são de Deus são alvo da mesma condenação que atingiu Jesus Cristo e participam da Sua Cruz.

O Evangelho quer mostrar o batismo “em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo”. Nos Atos dos Apóstolos se menciona o batismo em nome de Jesus Cristo. “Pedro lhes respondeu: Arrependei-vos e cada um de vós seja batizado em nome de Jesus Cristo para remissão dos vossos pecados, e recebereis o dom do Espírito Santo” (At 2,38). “E (Pedro) mandou que fossem batizados em nome de Jesus Cristo. Rogaram-lhe então que ficasse com eles por alguns dias” (At 10,48).

Atente-se também para o que Jesus diz: “Toda a autoridade (poder) me foi dada no Céu e sobre a terra”. Ele é o Senhor e é a Palavra que julgará toda a humanidade. “Quem me despreza e não recebe as minhas palavras, tem quem o julgue; a palavra que anunciei julgá-lo-á no último dia” (Jo 12,48). Jesus é o Homem restaurado na sua plenitude, de quem Deus dissera: “Deus os abençoou: Crescei, disse ele, e multiplicai-vos, enchei a terra e submetei-a. Dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus e sobre todos os animais que se arrastam sobre a terra” (Gn 1,28). A pessoa humana pelo pecado havia perdido esse poder para satanás: “Sabemos que somos de Deus, e que o mundo todo jaz sob o Maligno” (1Jo 5,19). Jesus derrotou satanás na Santa Cruz e recuperou o poder para a pessoa humana. Não devemos mais ter medo, nem do demônio, se queremos viver na graça de Jesus Cristo que é viver segundo o Espírito Santo, uma vida semelhante à de Jesus Cristo. Em Jesus Cristo, recuperamos a nossa dignidade sobre toda a Criação e somos senhores de todas as coisas pois não nos colocamos na dependência de nenhuma delas, mas só e exclusivamente dependemos de Deus. Todas as coisas são graças de Deus proporcionadas a nós para o nosso bem, até aquelas realidades que nos fazem participar da Cruz de Jesus Cristo.

O Evangelho também diz que o Senhor Jesus mandou seus Apóstolos batizarem em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo. Batizar, em grego, quer dizer mergulhar. Antes do pecado de Adão e Eva, a grande riqueza da pessoa humana era o próprio Deus, fonte de sua existência e de sua vida. Diante da tentação de “ser como deuses”, senhores do bem e do mal, nossos primeiros pais imaginaram Deus como um ser auto-suficiente que não precisa de ninguém para viver. A revelação da Santíssima Trindade nega essa suposição pois sabemos que o Filho vive do Pai e o Pai vive para o Filho, na unidade do Espírito Santo. A pessoa humana, de qualquer maneira é contingente, e precisa de uma fonte para sua vida. Ao rejeitar Deus, a criatura humana se fez carente das criaturas. Nasceu o amor pelo fruto do seu trabalho – o dinheiro – pelo afeto dos outros, pelo poder sobre os outros e pela fama. A criatura humana deixou de ser dependente de Deus para se fazer dependente das criaturas. Por isso, o Evangelho pede a renúncia a si mesmo e a todas as criaturas, para a pessoa humana voltar a depender somente de Deus e ser redimida. Como se faz isso? Todas as relações da pessoa humana devem ser renovadas. Não devem ser mais por causa das criaturas mesmas, mas todas elas devem ser por causa de Deus. Os filhos devem amar seus pais por causa de Deus, o marido amar a mulher por causa de Deus, devemos amar nossos vizinhos e próximos somente por causa de Deus, a pessoa humana deve ter uma relação com as outras criaturas somente por causa de Deus. Assim Deus está em todas as relações da pessoa humana e esta fica “mergulhada” em Deus. A união entre as raças e entre os diversos grupos de pessoas fica difícil porque as pessoas querem se amar por si mesmas e não por causa de Deus. Se Deus é a razão da nossa relação haverá perdão e paciência de sobra para suportar os outros. E também uma compreensão e uma misericórdia infinitas no coração da pessoa humana. Deus habitará em cada pessoa humana e haverá a PAZ.