sábado, 27 de fevereiro de 2010

1.º Domingo da Quaresma

Primeiro Domingo da Quaresma – Ano C - 2010

Deuteronômio 26,4-10 – Salmo 90 – Romanos 10,8-13 – Lucas 4,1-13

Retirou-se Jesus com eles para um lugar chamado Getsêmani e disse-lhes: Assentai-vos aqui, enquanto eu vou ali orar. E, tomando consigo Pedro e os dois filhos de Zebedeu, começou a entristecer-se e a angustiar-se. Disse-lhes, então: Minha alma está triste até a morte. Ficai aqui e vigiai comigo. Adiantou-se um pouco e, prostrando-se com a face por terra, assim rezou: Meu Pai, se é possível, afasta de mim este cálice! Todavia não se faça o que eu quero, mas sim o que tu queres. Foi ter então com os discípulos e os encontrou dormindo. E disse a Pedro: Então não pudestes vigiar uma hora comigo... Vigiai e orai para que não entreis em tentação. O espírito está pronto, mas a carne é fraca. Afastou-se pela segunda vez e orou, dizendo: Meu Pai, se não é possível que este cálice passe sem que eu o beba, faça-se a tua vontade! Voltou ainda e os encontrou novamente dormindo, porque seus olhos estavam pesados. Deixou-os e foi orar pela terceira vez, dizendo as mesmas palavras. Voltou então para os seus discípulos e disse-lhes: Dormi agora e repousai! Chegou a hora: o Filho do Homem vai ser entregue nas mãos dos pecadores...” (Mateus 26,36-45).

Vigiai e orai para que não entreis em tentação. O espírito está pronto, mas a carne é fraca. Esta frase resume o que a Liturgia da Palavra deste domingo quer dizer. Vigiar é estar atento ao que a Palavra de Deus diz para não se envolver em situações de pecado. Orar é elevar o coração a Deus pelo amor e isso também fortalece contra o pecado.

Jesus replicou-lhe [a Nicodemos]: Em verdade, em verdade te digo: quem não nascer do Alto não poderá ver o Reino de Deus. Nicodemos perguntou-lhe: Como pode um homem renascer, sendo velho? Porventura pode tornar a entrar no seio de sua mãe e nascer pela segunda vez? Respondeu Jesus: Em verdade, em verdade te digo: quem não renascer da água e do Espírito não poderá entrar no Reino de Deus. O que nasceu da carne é carne, e o que nasceu do Espírito é espírito. Não te maravilhes de que eu te tenha dito: Necessário vos é nascer do Alto.” (João 3,3-7). Aqui Jesus diz que é necessário nascer pelo Espírito porque a carne é fonte de pecado. Quem nasce do Espírito é filho de Deus. Porque não nasceu da carne, nem do sangue, mas de Deus mesmo (cf. João 1,13).

A Leitura do Deuteronômio traz o Credo de Israel. O arameu errante é Jacó, a quem Deus mudou o nome para Israel (aquele que luta contra Deus) e por esta razão os descendentes de Jacó são chamados “os filhos de Israel”. O Credo de Israel traz a Páscoa dos judeus, a libertação do Egito, como o nosso traz a nossa Páscoa, a Morte e a Ressurreição de Jesus e sua subida aos céus.

O Evangelho traz as três tentações de Jesus no deserto. Assim como a Eva, o demônio quer seduzir Jesus pelas tentações de poder. A Eva, desmentiu Deus e disse que ela não morreria, mas que se comesse o fruto da “árvore do bem e do mal” tornar-se-ia igual a Deus, senhora do bem e do mal, o que é uma mentira, pois Deus só faz o bem e nunca o mal. Por isso Jesus chama o demônio de mentiroso e pai da mentira (cf. João 8,44). Mas Jesus rejeita a três tentações de satanás. A primeira é a tentação de poder sobre a natureza em proveito próprio. Jesus Cristo nunca fez um milagre em proveito próprio: todas as suas maravilhas foram em favor de outras pessoas. A segunda tentação é a do poder político. Depois da multiplicação dos pães quiseram que Jesus fosse feito rei. “Jesus, percebendo que queriam arrebatá-lo e fazê-lo rei, tornou a retirar-se sozinho para o monte” (Jo 6,15). Jesus só aceita o que lhe for dado pelo Pai. Após a sua Ressurreição, “Jesus, aproximando-se, lhes disse: Toda autoridade me foi dada no céu e na terra” (Mt 28,18). Foi dada pelo Pai. Quantos políticos se prostram diante de satanás com mentiras e enganos para crescerem em poder!

A terceira tentação é fazer do Pai um servidor de Jesus. O diabo o tenta a que o Pai faça milagres quando Jesus quer. Jesus responde que não é correto tentar a Deus. Mas muitos fazem isso: os pastores de seitas dizem às pessoas para pararem de tomar os remédios porque Deus as irá curar, e isso já foi causa, até de morte, para alguns que pararam de tomar os indispensáveis remédios, que também são uma graça de Deus. Em certas igrejas de seitas estampam cartazes como este: “terça-feira de milagres”, ou seja, Deus deve fazer milagres quando o pastor decide que deve fazer, no dia em que o pastor decide. De sorte que o poder fascina as pessoas humanas, mas não seduziu Jesus, para quem tudo é obediência à vontade do Pai. Até a vontade de viver é uma vontade de poder.

A Leitura da carta aos Romanos que a Liturgia apresenta hoje é muito apreciada pelos protestantes, mas entra em conflito com algumas coisas do Evangelho. São Paulo fala muito em confessar Jesus como Senhor “com a boca”. Ora não adianta nada crer que Jesus é o Filho de Deus, que é o Messias, que ressuscitou ao terceiro dia e subiu aos céus, de onde voltará no último dia, se não o tomarmos como o nosso “caminho”. “Não se perturbe o vosso coração. Credes em Deus, crede também em mim. Na casa de meu Pai há muitas moradas. Não fora assim, e eu vos teria dito; pois vou preparar-vos um lugar. Depois de ir e vos preparar um lugar, voltarei e tomar-vos-ei comigo, para que, onde eu estou, também vós estejais. E vós conheceis o caminho para ir aonde vou. Disse-lhe Tomé: Senhor, não sabemos para onde vais. Como podemos conhecer o caminho? Jesus lhe respondeu: Eu sou o caminho, a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai senão por mim. Se me conhecêsseis, também certamente conheceríeis meu Pai; desde agora já o conheceis, pois o tendes visto. Disse-lhe Filipe: Senhor, mostra-nos o Pai e isso nos basta. Respondeu Jesus: Há tanto tempo que estou convosco e não me conheceste, Filipe! Aquele que me viu, viu também o Pai. Como, pois, dizes: Mostra-nos o Pai...” (João 14,1-9). Não se pode ir ao Pai a não ser pelo caminho que Jesus trilhou: o caminho da Cruz. Crer em Jesus Cristo é também crer no caminho da santa cruz. “Em seguida, Jesus disse a seus discípulos: Se alguém quiser vir comigo, renuncie-se a si mesmo, tome sua cruz e siga-me. Porque aquele que quiser salvar a sua vida, perdê-la-á; mas aquele que tiver sacrificado a sua vida por minha causa, recobrá-la-á. Que servirá a um homem ganhar o mundo inteiro, se vem a prejudicar a sua vida? Ou que dará um homem em troca de sua vida?... Porque o Filho do Homem há de vir na glória de seu Pai com seus anjos, e então recompensará a cada um segundo suas obras” (Mateus 16,24-27). Renunciar a si mesmo é renunciar ao poder e deixar-se conduzir pelo Pai, como Jesus o fez.

Jesus também disse, em contraste com São Paulo neste trecho da Carta aos Romanos: “Nem todo aquele que me diz: Senhor, Senhor, entrará no Reino dos céus, mas sim aquele que faz a vontade de meu Pai que está nos céus” (Mt 7,21). Certamente na mente de São Paulo, tudo isto que afirmamos estava presente. É ele mesmo que afirma: “Porque os verdadeiros circuncisos somos nós, que prestamos culto a Deus pelo Espírito de Deus, e pomos nossa glória em Jesus Cristo, e não confiamos na carne. No entanto, eu poderia confiar também na carne. Se há quem julgue ter motivos humanos para se gloriar, maiores os possuo eu: circuncidado ao oitavo dia, da raça de Israel, da tribo de Benjamim, hebreu e filho de hebreus. Quanto à lei, fariseu; quanto ao zelo, perseguidor da Igreja; quanto à justiça legal, declaradamente irrepreensível. Mas tudo isso, que para mim eram vantagens, considerei perda por Cristo. Na verdade, julgo como perda todas as coisas, em comparação com esse bem supremo: o conhecimento de Jesus Cristo, meu Senhor. Por ele tudo desprezei e tenho em conta de esterco, a fim de ganhar Cristo e estar com ele. Não com minha justiça, que vem da lei, mas com a justiça que se obtém pela fé em Cristo, a justiça que vem de Deus pela fé. Anseio pelo conhecimento de Cristo e do poder da sua Ressurreição, pela participação em seus sofrimentos, tornando-me semelhante a ele na morte, com a esperança de conseguir a ressurreição dentre os mortos. Não pretendo dizer que já alcancei (esta meta) e que cheguei à perfeição. Não. Mas eu me empenho em conquistá-la, uma vez que também eu fui conquistado por Jesus Cristo. Consciente de não tê-la ainda conquistado, só procuro isto: prescindindo do passado e atirando-me ao que resta para a frente, persigo o alvo, rumo ao prêmio celeste, ao qual Deus nos chama, em Jesus Cristo” (Filipenses 3,3-14). Por isto damos razão a São Paulo e nunca o colocaremos em contraste com o Senhor Jesus Cristo como os Evangelhos nos mostram.

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